O campo inteiro está sob o signo da peça. Não há fatos-macacos para os que trabalham no exterior, mas na revista haverá um «ballet de fatos-macacos» e, por isso, trabalhou-se dia e noite no fabrico de peças dessas, com mangas de balão. As tábuas da Sinagoga de Assen foram serradas para fazer o palco para o bailado. Um carpinteiro exclamou: «Que diria Deus se soubesse que a Sua Sinagoga seria usada com tal propósito?» É incrível, não é, a Sinagoga de Deus de Assen. Oh, Maria, Maria – na noite do último transporte, as pessoas trabalharam o dia todo para o espectáculo. Tudo aqui é de uma loucura e tristeza indescritíveis e tragicómicas. (pp. 232-233)
Para muitos de nós, uma vida inteira não será suficiente para superar o facto de termos permitido que os nossos idosos e doentes partissem em primeiro lugar. É uma política conhecida baseada no «instinto de autopreservação». O pai perguntou a um enfermeiro do último transporte: «Como é possível deixarem partir pessoas que se encontram internadas, às portas da morte? Com certeza que é contra a ética médica». Ao que o enfermeiro respondeu com ar grave: «O hospital entrega um cadáver para poder manter aqui um vivo». Não tina a mínima intenção de brincar, estava perfeitamente sério. (p. 234)
Deixámos o campo a cantar, o pai e a mãe firmes e calmos, tal como o Mischa. (p. 238)
Cartas 1941-1943, Trad. Ana Leonor Duarte Patrícia Couto, Assírio & Alvim, 2009
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